segunda-feira, 3 de novembro de 2008

UMA PESSOA BATUTA

Os trovões que ecoaram junto com a chuva que caiu em Descalvado neste final de semana tinham um som diferente. Não foram trovões estridentes, não pareceram desafinados ou fora do compasso.
Pelo contrário, aos ouvidos das pessoas que gostam de boa música e que se lembram dos bons tempos de outrora, eles tinham uma sonoridade toda especial.
Muitas dessas pessoas só foram descobrir o motivo do barulho orquestrado dos trovões na tarde de domingo. O céu estava recebendo o maestro Vaninho Machado, carinhosamente chamado por “Caco”, o eterno maestro da nossa banda, a Corporação Musical Santa Cecília.
“Seu Vaninho” nos deixou e deixou a cidade mais entristecida. Mais uma boa alma que se vai, magnífico pela sua simplicidade e eterno pela sua humildade.
Querido por todos, adormece para a eternidade, mas não se apagará da nossa lembrança.
Se como pessoa deixará saudades pelo seu jeito carinhoso de tratar as pessoas, como maestro e músico deixará ainda mais.
A comunidade de Descalvado já tinha este sentimento com a falta da banda, uma luta árdua de Vaninho nos últimos anos, que fazia de tudo para que ela voltasse a se apresentar.
Como era bom vê-lo feliz, enquanto nos alegrava com suas músicas. Felizes os que tiveram o privilégio de poder, nem que por apenas um dia, ver a nossa banda em ação sob o comando do maestro Vaninho.
A música e a banda ocuparam boa parte da sua vida. Posso dizer que se misturaram. A banda era o “Caco” e o “Caco” era a banda, mas fazia tempo que não estavam deixando-o sentir este prazer. O prazer de comandar a banda, reunindo os velhos músicos para tocar as velhas marchas e os antigos dobrados que faziam sucesso nas apresentações da “Furiosa”.
Para os músicos mais antigos era difícil não atender ao pedido do "Caco" quando a banda precisava sair. Apesar de ultimamente podermos contar nos dedos as vezes que isso aconteceu, muitos deles nunca resistiram ao chamado e ao apelo do “velho maestro”.
Sempre foi assim e só assim a banda saia às ruas, o que deve encher de orgulho aqueles que estiveram com o “Seu Vaninho” nos últimos momentos que empunharam, juntos, os instrumentos musicais.
A simplicidade, o amor pela música e uma vida dedicada à banda não foram suficientes para sensibilizar as autoridades. A banda simplesmente desapareceu1
Uma das últimas apresentações no coreto do Jardim Velho aconteceu em 2002, quando a Divisão de Cultura organizou uma extensa programação em comemoração ao Dia da Música.
Naquele dia lá estava “Seu Vaninho”, orgulhoso com a batuta na mão e fazendo questão de homenagear seu antigo mestre, o maestro Quique Todescan, a quem sucederia no comanda da Corporação Musical Santa Cecília.
“Caco” morreu sem poder ter o seu pedido atendido novamente. A banda nunca mais foi às ruas, exceto em apresentações mínimas na procissão da Semana Santa e com número reduzido de músicos.
“Vaninho” estava feliz ultimamente. Sabia que a esperança com possibilidade da volta da Banda havia se renovado para os próximos anos
Foi-se, porém, sem sentir este último prazer, mas deixará uma marca inigualável no cenário musical.
Deixará saudades!
O meu consolo é que, além dos céus abrigarem uma alma bondosa, um espírito de luz, os trovões nunca mais serão os mesmos aqui em Descalvado.
Eu sempre vou apostar que “Seu Vaninho” estará regendo-os em dias de chuva.
E vou ficar muito feliz por isso.

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